domingo, 20 de outubro de 2013

"Parte 6"

"Nem pensava em ter, que esquecer você"

  Marina entra no quarto com passos firmes e não planejados. Carrega consigo o vento que arrasta os cílios da janela, os cabelos da colcha. Quando cansada de promover batuques dissonantes na madeira do piso, que era estrategia para sobressair ao samba forte e angustiado que ensaiava seu coração. Ela se apoiou nas costas da cadeira e engolindo todo o ar possível, começou a disparar toda a sua verdade, não dita antes, nem em pensamento. Como se as paredes fossem velhas fofoqueiras que boquiabertas, depois de ouvirem todo o desabafo, fossem correndo contar a Diego.
_Nunca senti tanta vergonha de um sentimento que me pareceu dentre todos os que tive, o mais lindo. O mais doce. Mas o gosto amargo de agora, não se compara a nada que já provei. Nem nos piores momentos de infelicidade. O destinei tão puro, cuidadoso. Em troca? Recebi olhos arregalados e boca insensível que se dizia assustada com tanto bem querer... Como pode os vendavais acertarem minhas roupas no varal e mandar para longe, cada peça com a sua história? E deixar a deriva, minha alma nua e hipotérmica de paixão. Como pode o vento de tão forte e cruel arrancar flor por flor do meu vestido predileto, e levar de mim a primavera dos meus dias? É tudo tão estúpido! Como pode o amor, bater na porta do meu coração, insistir para entrar, sentar-se e antes que pudesse me dar conta, já fazer morada? Se alimentar da minha alegria, se embebedar dos meus sorrisos. Sem fazer ao menos um passeio pelas terras de quem amo? Como pode haver lógica em um cupido de uma flecha só? Que economiza a munição, enquanto eu esbanjo minhas forças amarradas em passos que insistem em correr de mim, quebrando qualquer esquina? Odeio esse sentimento que ironicamente foi o mais belo que já senti. E na mesma intensidade que esse amor cresci, me sinto forçadamente diminuída.
 Já sentada de frente para o espelho. Enquanto gritava, escrevia cada palavra como em um ditado, datou a carta e assinou, como se não fosse dirigi-la a se mesma. Se direcionando para a janela ela continua, mas agora, observando a imensidão que cabe em qualquer olhar sem rumo. Ela conclui em um tom cansado e pausado.
_ A distância já não é mais geográfica. Ultrapassou os limites desta dimensão. Eu estou cansada de amar sozinha um sentimento que acolheria uma nação...
Ela começa a pensar na amizade que viera levando com Diego. Ele sempre indiferente como se nunca tivessem admirado um luar juntos. Como se desconhecesse toda a afinidade de almas. Sempre tão técnico, frio...
 Nesse momento, exausta e aos prantos, Marina se joga na cama como quem mira um abismo. O envelope endereçado a si mesmo, contem áudio de decibéis elevados que podem estourar tímpanos sensíveis. Mas Diego? Não compreenderia. Se quer agitaria uma molécula de seu corpo, para entender o que Nina se dispunha a explicar nem que fosse de desenho a giz.
Em um súbito de loucura, sintoma de quem sofre da doença do seculo, "O amor não correspondido". Ela pega a carta e rasga em seis pedaços. Em seguida, incoerente como manda o figurino de quem se veste de paixão. Disca a sequencia de números no teclado do celular, que veicula o seu contato com a paz. Corrijo, com a antiga paz. Mas apos onze bipes, desiste e se poe a juntar suas palavras, como se não soubesse de cor todo seu discurso. Ela cola os pedaços da carta, mas bem sabe que o mesmo não se aplica ao coração quebrado.
 Com semblante de derrota, e de olheiras escuras como a noite que já chegara. Marina sai do quarto. Mal sabe que venceu mais uma etapa rumo ao amadurecimento pessoal. Amou, e sofreu como quem pede para morrer e sobrevive de cicatrizes. Mas da porta para fora, seu semblante mutava. Parecia dez anos mais velha. Vinte gigantes mais forte.

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